Quem sou eu

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São Francisco do Conde, Bahia, Brazil
Professor, (psico)pedagogo, coordenador pedagógico escolar e Especialista em Educação.
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"Liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber" (Art. 205 da Constituição de 1988).

Ø Se eu sou um especialista, então minha especialidade é saber como não ser um especialista ou em saber como acho que especialistas devem ser utilizados. :)



“[...] acho que todo conhecimento deveria estar em uma zona de livre comércio. Seu conhecimento, meu conhecimento, o conhecimento de todo o mundo deveria ser aproveitado. Acho que as pessoas que se recusam a usar o conhecimento de outras pessoas estão cometendo um grande erro. Os que se recusam a partilhar seu conhecimento com outras pessoas estão cometendo um erro ainda maior, porque nós necessitamos disso tudo. Não tenho nenhum problema acerca das ideias que obtive de outras pessoas. Se eu acho que são úteis, eu as vou movendo cuidadosamente e as adoto como minhas” ("O caminho se faz caminhando - conversas sobre educação e mudança social", Paulo Freire e Myles Horton: p. 219).

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

*Atritos*

Por Neilton Lima
Professor, pedagogo e especialista em psicopedagogia.

Nossa humanização acontece com o "outro", apesar dele. Isso implica encontros e desencontros. Paradoxalmente, se "o inferno são os outros", os "outros" também são o paraíso. Encontrei essa conclusão na experiência de vida e transformada em signos no poema abaixo de "Roberto Crema", o qual compartilho com você. 


Ninguém muda ninguém;
ninguém muda sozinho;
nós mudamos nos encontros.

Simples, mas profundo, preciso.
É nos relacionamentos que nos transformamos.
Somos transformados a partir dos encontros,
desde que estejamos abertos e livres
para sermos impactados
pela idéia e sentimento do outro.

Você já viu a diferença que há entre as pedras
que estão na nascente de um rio,
e as pedras que estão em sua foz?

As pedras na nascente são toscas,
pontiagudas, cheias de arestas.
À medida que elas vão sendo carregadas
pelo rio sofrendo a ação da água
e se atritando com as outras pedras,
ao longo de muitos anos,
elas vão sendo polidas, desbastadas.

Assim também agem nossos contatos humanos.
Sem eles, a vida seria monótona, árida.

A observação mais importante é constatar
que não existem sentimentos, bons ou ruins,
sem a existência do outro, sem o seu contato.

Passar pela vida sem se permitir
um relacionamento próximo com o outro,
é não crescer, não evoluir, não se transformar.
É começar e terminar a existência
com uma forma tosca, pontiaguda, amorfa.

Quando olho para trás,
vejo que hoje carrego em meu ser
várias marcas de pessoas
extremamente importantes.

Pessoas que, no contato com elas,
me permitiram ir dando forma ao que sou,
eliminando arestas,
transformando-me em alguém melhor,
mais suave, mais harmônico, mais integrado.

Outras, sem dúvidas,
com suas ações e palavras
me criaram novas arestas,
que precisaram ser desbastadas.
Faz parte...

Reveses momentâneos
servem para o crescimento.
A isso chamamos experiência.

Penso que existe algo mais profundo,
ainda nessa análise.
Começamos a jornada da vida
como grandes pedras,
cheios de excessos.

Os seres de grande valor,
percebem que ao final da vida,
foram perdendo todos os excessos
que formavam suas arestas,
se aproximando cada vez mais de sua essência,
e ficando cada vez menores, menores, menores...

Quando finalmente aceitamos
que somos pequenos, ínfimos,
dada a compreensão da existência
e importância do outro,
e principalmente da grandeza de Deus,
é que finalmente nos tornamos grandes em valor.

Já viu o tamanho do diamante polido, lapidado?
Sabemos quanto se tira
de excesso para chegar ao seu âmago.
É lá que está o verdadeiro valor...

Pois, Deus fez a cada um de nós
com um âmago bem forte
e muito parecido com o diamante bruto,
constituído de muitos elementos,
mas essencialmente de amor.

Deus deu a cada um de nós essa capacidade,
a de amar...
Mas temos que aprender como.

Para chegarmos a esse âmago,
temos que nos permitir,
através dos relacionamentos,
ir desbastando todos os excessos
que nos impedem de usá-lo,
de fazê-lo brilhar.

Por muito tempo em minha vida acreditei
que amar significava evitar sentimentos ruins.
Não entendia que ferir e ser ferido,
ter e provocar raiva,
ignorar e ser ignorado,
faz parte da construção do aprendizado do amor.
Não compreendia que se aprende a amar
sentindo todos esses sentimentos contraditórios e...
os superando.

Ora, esses sentimentos simplesmente
não ocorrem se não houver envolvimento...
E envolvimento gera atrito.
Minha palavra final: ATRITE-SE!

Não existe outra forma de descobrir o amor.
E sem ele a vida não tem significado.

Um forte abraço!
Neilton Lima.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Novas Idéias de um Pedagogo I

Por Neilton Lima*
Professor, pedagogo e especialista em psicopedagogia*
“Não é a compreensão que gera o ato, mas é muito mais o ato que produz a compreensão”.
LURIA

O desenvolvimento da linguagem escrita (simbolismo de segunda ordem), e do ser humano como um todo, acontece antes da criança ingressar na escola. Isso porque está ligado à história da criança (ela já está exposta aos elementos da cultura e à presença do outro, que se torna o mediador entre ela e a cultura). Logo, existem experiências como gestos, brinquedos, signos visuais, falas e desenhos (simbolismos de primeira ordem) nos primeiros períodos vivenciados por ela que servirão de base para a formação de um ser que se completa a cada dia. A escola e o professor não só devem reconhecer como também valorizar isso. Essa valorização pode acontecer através de uma prática pedagógica que dê continuidade e profundidade a essas experiências significativas e que trabalhem a seu favor (Lúria e Vygotsk).

 O gesto é signo visual inicial que contém a futura escrita da criança. Os gestos são a escrita no ar, e os signos escritos são, freqüentemente, simples gestos que foram fixados. Os jogos das crianças fazem com que objetos denotem outros por meio da imaginação e se transformem em brinquedos (é nessa substituição ou nesses gestos representativos que uns se tornam signos dos outros). Trata-se de uma atividade imaginária que gostaria de realizar de fato, mas que naquele momento era impossível. Por exemplo, o garoto transforma um cabo de vassoura em um cavalo e sai com ele galopando. Daí o desenho começa quando a linguagem falada já teve grande progresso, pois esta auxiliará na interpretação dos desenhos que as crianças fazem. O primeiro estágio do desenvolvimento da linguagem escrita é a linguagem verbal, que também é o ponto de partida do desenho, pois as crianças começam a desenhar de memória sobre aquilo de que começaram a conhecer.

Ora, se a escrita é a representação de objetos por meio de signos, ela é alto grau de abstração (o signo tem como finalidade representar a nossa fala, e não o mundo material. Por exemplo, quando escrevemos a palavra MAÇÃ, estamos representando o que falamos, quando a maçã está desenhada imediatamente nos vem à imagem real dela). Requer, portanto, memória, inteligência abstrata e capacidade de processar informação. Algo que a criança terá com o amadurecimento. Por isso é recomendável trabalhar com coisas concretas nessa fase, porque o escrever ainda não é utilizado como um instrumento a serviço da memória, mas o desenhar, sim. Ou seja, figuras simbólicas contendo um significado pessoal, além de serem mais significativas são o elemento inicial (simples representações) que, mais tarde se tornará a escrita (mnemônica, alfabética).

Tudo isso parece justificar um aprendizado dinâmico, criativo e paciente da linguagem escrita (e todas as outras formas de linguagem), e não apenas a prática de uma habilidade motora rigorosa e tradicional.  
Um forte abraço!
Neilton Lima.

domingo, 15 de janeiro de 2012

Panorama da Psicopedagogia

Por Neilton Lima*
Professor, pedagogo e especialista em psicopedagogia*

A psicopedagogia nasceu na Europa em 1946, migrou para a Argentina com marcas da literatura francesa e influenciou o Brasil em 1970, sendo que, nos anos 90, proliferaram seus cursos pelas regiões Sul e Sudeste do país. Foi fruto da articulação de conhecimentos das áreas de Psicologia, Pedagogia, Psicanálise e Medicina, em que hoje busca compreender, desencadear e orientar o processo de aprendizagem.
O ato de aprender implica uma série de fatores, entre eles o cognitivo, o afetivo e o sócio-cultural. Isso significa que existem níveis de inteligência e, portanto, de ensino-aprendizagem para cada estrutura cognitiva (Piaget); diferentes investimentos afetivos em relação a um objeto levarão os sujeitos a aprenderem de formas variadas (Freud) e que; sujeitos de distinta cultura, também suas aprendizagens em relação a um mesmo objeto serão diferentes, devido às influências do meio (Pichón).

A articulação desses conhecimentos, mais o olhar e a escuta atentos, fez-se nascer o método clínico psicopedagógico fundamentado na epistemologia convergente (Jorge Visca). Seu caráter é diagnóstico, corretor e preventivo, com o qual se tenta conduzir à aprendizagem. É um procedimento à altura da abrangência do processo formativo educacional, pois impulsiona o psicopedagogo a se lançar nos âmbitos onde esse processo possa se originar e desenvolver seja na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa (predominantemente), nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais (LDB).

Destacamos a educação escolar porque é um espaço criado exclusivamente como meio formal do ensino-aprendizagem, ou seja, é a sua instituição própria, mas não a única. Aliás, quanto mais intencional e planejado for o processo de ensino-aprendizagem, para o nosso propósito ainda é melhor. Vale ressaltar, também, que o funcionamento do sujeito é o resultado da dinâmica de interação entre o cognitivo e o afetivo, mais os impactos provocados dentro do meio específico em que ele convive com outras pessoas. Esse jogo está no espaço escolar e fora dele.

Baseado em Jorge Visca o procedimento diagnóstico transcorre da seguinte forma: primeiro as ações do entrevistador, aplicação da EOCA (Entrevista Operativa Centrada na Aprendizagem) e dos testes, anamnese e, por fim, a elaboração do informe. De modo que, o ponto de partida é uma consulta inicial (dos pais, responsáveis ou do próprio paciente). Daí nasce uma entrevista contratual com o intuito de coletar informações e finda na devolução.  O cuidado de uma correta aplicação, evolução e extração das conclusões úteis são fundamentais para se entender a aprendizagem.
Agora, por que diagnosticar? Para o terapeuta, o propósito é identificar os desvios e os obstáculos básicos no Modelo de Aprendizagem do sujeito que o impedem de crescer na aprendizagem dentro do esperado pelo meio social. E o que fazer com o achado? Corrigir ele próprio, se puder fazê-lo, ou encaminhar para o profissional especializado que o consiga.

O processo educacional acontece na relação do sujeito ativo com o meio que o envolve. Ou seja, esse processo é desencadeado pela AÇÃO (física, cognitiva e afetiva), provocada por um estímulo ou necessidade, que rompe com o equilíbrio ou adaptação existente entre o organismo e seu meio, ao mesmo tempo em que busca reestabelecer tal equilíbrio (REFLEXÃO), entretanto, devolvendo o sujeito transformado, acrescido e readaptado à sua realidade (com mais condições de inová-la, mantê-la ou transformá-la), pronto para novas ações (Piaget). 

É a essa ação que deve interessar educadores e sobre ela os psicopedagogos. Cabe aos educadores estimular e motivar ações que abram caminhos para o conhecimento, e cabe aos psicopedagogos o esforço de manter e impulsionar saudavelmente os educandos nesses caminhos, diagnosticando, corrigindo e prevenindo possíveis desvios.

Acredito no poder de superação do sujeito. Podemos ir além dos nossos obstáculos e desvios cognitivos e afetivos próprios. Porém, uma coisa que incomoda bastante dentro dessa área é o fato de que podemos descobrir que nossos obstáculos e desvios, inclusive os causadores ou limitadores do modelo de aprendizado, esteja ou seja a própria realidade do sujeito ou aspectos dela. Realidade social, econômica. Nesse instante, cabe invocar a dimensão política da psicopedagogia. Ela tem uma?

O mal da educação acaba sendo o bem da psicopedagogia. Caso o processo de aprendizagem acontecesse bem na educação básica, não haveria sentido ou razão de existir do fazer psicopedagógico do ponto de vista remediativo. Nunca foi tão importante investir seriamente em educação e qualidade de vida, econômica e politicamente, mesmo que, em nome disso, cometêssemos um "suicídio psicopedagógico"
Um forte abraço!
Neilton Lima.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Uma pergunta, várias respostas... “O que é filosofia?”

Por Neilton Lima
Professor, pedagogo e especialista em psicopedagogia.

Não há apenas uma definição da Filosofia, mas várias. E, além de várias, as definições não parecem poder ser reunidas numa só mais ampla. Logo, cada definição possui limites e possibilidades, sendo expressões que contém ou indicam alguns aspectos que poderão entrar na definição da Filosofia.

Para mim, a Filosofia é o exercício da razão em busca do conhecimento, da liberdade e da felicidade, fazendo do ser humano a conjugação inter-relacionada de quatro verbos: pensar, sentir, falar e agir. Baseado na obra “Convite à filosofia”, de Marilena Chauí, Filosofia é:

01.    “A decisão de não aceitar como naturais, óbvias e evidentes as coisas, as idéias, os fatos, as situações, os valores, os comportamentos de nossa existência cotidiana; jamais aceitá-los sem antes havê-los investigado e compreendido”;
02.    “O instrumento com o qual serve para não darmos nossa aceitação imediata às coisas, sem maiores considerações”.
03.     “A exigência humana de provas e justificações racionais que validem ou invalidem as crenças cotidianas”.
04.    “Para Sócrates, começamos a buscar o conhecimento quando somos capazes de dizer: “Só sei que nada sei”. Assim, a Filosofia é a capacidade de reconhecer a própria ignorância e superá-la. É a busca da verdade. 
05.    “Para Platão, a Filosofia começa com a admiração. Ela é um saber verdadeiro que deve ser usado em benefício dos seres humanos para que vivam numa sociedade justa e feliz”.
06.    “Para Aristóteles, a Filosofia começa com o espanto. Pois os homens começam e começaram sempre a filosofar movidos pelo espanto. Aquele que se coloca uma dificuldade e se espanta reconhece sua própria ignorância. De sorte que, se filosofaram, foi para fugir da ignorância”.
07.    “Para Kant, as indagações fundamentais da Filosofia são:
a) Que podemos saber? É a pergunta sobre o conhecimento, isto é, sobre os fundamentos do pensamento em geral e do pensamento científico em particular;
b) Que podemos fazer? É a pergunta sobre a ação e a expressão humana, isto é, sobre os fundamentos da ética, da política, das artes, das técnicas e da história;
c) Que podemos esperar? É a pergunta sobre a esperança de uma outra vida após a morte, isto é, sobre os fundamentos da religião. Assim, Filosofia seria o conhecimento que a razão adquire de si mesma para saber o que pode conhecer, o que pode fazer e o que pode esperar, tendo como finalidade a felicidade humana”.
08.    “Para Marx, a Filosofia havia passado muito tempo apenas contemplando o mundo e que se tratava, agora, de conhecê-lo para transformá-lo, transformação que traria justiça, abundância e felicidade para todos”.
09.    “Para Merleau-Ponty, a Filosofia é um despertar para ver e mudar nosso mundo”.
10.    “Para Espinosa, a Filosofia é um caminho árduo e difícil, mas que pode ser percorrido por todos, se desejarem a liberdade e a felicidade”.
11.    “Para Descartes, a Filosofia é o estudo da sabedoria, conhecimento perfeito de todas as coisas que os humanos podem alcançar para o uso da vida, a conservação da saúde e a invenção das técnicas e das artes com as quais ficam menos submetidos às forças naturais, às intempéries e aos cataclismos”.
12.     “O mesmo se disséssemos que o objeto da Filosofia não é o conhecimento da realidade, nem o conhecimento da nossa capacidade para conhecer, mesmo se disséssemos que o objeto da Filosofia é apenas a vida moral ou ética, ainda assim o estilo filosófico e a atitude filosófica permaneceriam os mesmos, pois as perguntas filosóficas – o quê, por que e como – permanecem”.
13.     “Uma operação sistemática, com coerência e lógica, que tem uma vocação para compreender como se relacionam, se conectam e se encadeiam num todo racionalmente compreensível as coisas e os fatos que aparecem de modo fragmentado e desconexo em nossa experiência cotidiana”.
14.     “O esforço racional para conceber o Universo como uma totalidade ordenada e dotada de sentido. Cabe à Filosofia a tarefa de conhecer a realidade inteira, provando que o Universo é uma totalidade, isto é, algo estruturado e ordenado por relações de causa e efeito, e que essa totalidade é racional, ou seja, possui sentido e finalidade compreensível pelo pensamento”.
15.    “Fundamentação teórica e crítica dos conhecimentos e das práticas, que investiga e interpreta o significado de idéias gerais”. Etc.

Um forte abraço!
Neilton Lima.

domingo, 1 de janeiro de 2012

Filosofia: o amor à sabedoria.

Por Neilton Lima
Professor, pedagogo e especialista em psicopedagogia.
A função da filosofia é desbanalizar a vida. Para isso, ela nos leva a tomar distância da vida cotidiana e de nós mesmos, interrogando sobre nós, as coisas e o mundo, desejando conhecer por que cremos no que cremos, por que sentimos o que sentimos e o que são nossas crenças e nossos sentimentos. Sua investigação ocupa o lugar das certezas cotidianas. A indagação e o questionamento tornam a realidade e seus fatos estranhos, espantosos, algumas vezes incompreensíveis e enigmáticos. Partindo desse momento de abalo das opiniões estabelecidas, a filosofia mergulha o sujeito curioso na profundidade dos grandes pensadores.
O pensamento filosófico é racional, crítico, radical e sistemático. A filósofa Marilena Chauí diz por quê:


“Por que racionais? Por três motivos principais: em primeiro lugar, porque racional significa argumentado, debatido e compreendido; em segundo, porque racional significa que, ao argumentar e debater, queremos conhecer as condições e os pressupostos de nossos pensamentos e os dos outros; em terceiro, porque racional significa respeitar certas regras de coerência do pensamento para que um argumento ou um debate tenham sentido, chegando a conclusões que podem ser compreendidas, discutidas, aceitas e respeitadas por outros”.

“A palavra ‘crítica’ vem do grego e possui três sentidos principais: 1) capacidade para julgar, discernir e decidir corretamente; 2) exame racional de todas as coisas sem preconceito e sem pré-julgamento; 3) atividade de examinar e avaliar detalhadamente uma idéia, uma valor, um costume, um comportamento, uma obra artística ou científica. A atitude filosófica é uma atitude crítica porque preenche esses três significados da noção de crítica, a qual, como se observa, é inseparável da noção de racional, que vimos anteriormente”.

“A reflexão filosófica é radical porque vai à raiz do pensamento, pois é um movimento de volta do pensamento sobre si mesmo para pensar-se a si mesmo, para conhecer como é possível o próprio pensamento ou o próprio conhecimento”.

“A palavra sistema vem do grego, significa um todo cujas partes estão ligadas por relações de concordância interna. No caso do pensamento, significa um conjunto de idéias internamente articuladas e relacionadas, graças a princípios comuns ou a certas regras e normas de argumentação e demonstração que as ordenam e as relacionam num todo coerente. Dizer que as indagações filosóficas são sistemáticas significa dizer que a Filosofia trabalha com enunciados precisos e rigorosos, busca encadeamentos lógicos entre os enunciados, opera com conceitos ou idéias obtidos por procedimentos de demonstração e prova, exige a fundamentação racional do que é enunciado e pensado (...)”.

Filosofar é articular as diversas áreas do conhecimento de forma racional, crítica, radical e sistemática e provocar fecundas discussões sobre o mundo das idéias e sobre a história do pensamento. É compreender que as idéias científicas, religiosas, artísticas, morais, políticas, e mesmo filosóficas, são determinadas pelas condições históricas em que aparecem e se transformam. É buscar e encontrar a ligação entre certas idéias e certos comportamentos, as relações entre essas idéias e esses comportamentos como se tivessem alguns princípios que os unissem ou relacionassem. Surgem temas caros para a reflexão que dialogam mutuamente, dentre eles: Razão, Verdade, Conhecimento, Ciência, Ética, Política, Arte, Técnica, Religião, Metafísica, História, Lógica etc.
É preciso astúcia para decifrar e interpretar os jogos e desafios postos pela vida. E tão importante quanto compreendê-los é compreender-se. A filosofia é essa fonte de astúcia que nos leva a desconfiar da realidade tal como ela nos apresenta e é apresentada, ampliando nosso conhecimento sobre as coisas, sobre o mundo e sobre nós mesmos.

Logo, ela serve para informar, despertar o interesse pela cultura e o prazer da interrogação, provocar o raciocínio e a reflexão crítica. A filosofia nos traz a felicidade de ver as próprias coisas. Nesse sentido, ela, como o exercício do pensamento, nos liberta da ignorância ou nos impulsiona para a liberdade do pensar. Vejamos outra vez o que diz Chauí:

“Essa mudança de atitude indica algo bastante preciso: quem não se contenta com as crenças ou opiniões preestabelecidas, quem percebe contradições e incompatibilidade entre elas, quem procura compreender o que elas são e por que são problemáticas está exprimindo um desejo, o desejo de saber. E é exatamente isso o que, na origem, a palavra filosofia significa, pois, em grego, philosophía quer dizer “amor à sabedoria”.

Não existem preconceitos e crenças inquestionadas no campo filosófico. Há, sim, desconfiança das aparências das coisas, dos outros e de nós mesmos e a busca constante da realidade verdadeira, mesmo que para isso seja preciso lutar contra as condições adversas em que nos encontramos – pois o aprendizado chega a ser doloroso.  

Indagar é o verbo desconcertante e embaraçoso: qual é a origem, o sentido e a realidade de nossas crenças? Antes de tentar resolver os enigmas do mundo externo será mais proveitoso que comecemos por compreender a nós mesmos (Sócrates). Quando uma crença contradiz outra ou parece incompatível com outra, ou quando aquilo em que sempre acreditamos é contrariado por uma outra forma de conhecimento, entramos em crise. A filosofia se interessa por esses momentos críticos no pensamento, na linguagem e na ação, pois é nesses momentos que se manifesta mais claramente a exigência de fundamentação das idéias, dos discursos e das práticas.
 Quando sistemas religiosos, éticos, políticos, científicos e artísticos estabelecidos se envolvem em incoerências, ambigüidades ou incompatibilidades internas e contradizem-se uns aos outros e buscam transformações e mudanças cujo sentido ainda não está claro e precisa ser compreendido, o desejo de saber vai em direção à atitude filosófica. Segundo Cahuí:

“O que está por trás de tais perguntas? O fato de que estamos mudando de atitude. Quando o que era objeto de crença aparece como algo contraditório ou problemático e por isso se transforma em indagação ou interrogação, estamos passando da atitude costumeira à atitude filosófica”.

A atitude filosófica (realidade externa dos seres humanos) é também uma atitude crítica porque possui duas faces: uma negativa e outra positiva. Na primeira, como vimos, é um dizer “não” aos “pré-conceitos” e aos “pré-juízos”, aos fatos e às idéias da experiência cotidiana, ao estabelecido, interrogando suas causas e buscando o seu sentido. É positiva como interrogação. Assim, as características básicas da atitude filosófica são: 1) a pergunta “o que é?”, ou seja, qual é a realidade ou a significação de algo; 2) a pergunta “como é?”, ou seja, como é a estrutura ou o sistema de relações que constitui a realidade de algo; 3) a pergunta “por que é?”, ou seja, o motivo de algo existir, qual é a sua origem ou a sua causa. Esse “algo” pode vir a ser uma coisa, uma idéia, um valor ou um comportamento, ou seja, dirige-se ao mundo que nos rodeia e aos seres humanos que nele vivem e com ele se relacionam.


A interrogação sobre o mundo, sobre as coisas e sobre si mesmo nasce do desejo de conhecê-lo, conhecê-las e conhecer-se. É um espantar-se com o pensamento e pelo pensamento:

“(...) por meio de nosso pensamento, tomamos distância do nosso mundo costumeiro, olhando-o como se nunca o tivéssemos visto antes, como se não tivéssemos tido família, amigos, professores, livros e outros meios de comunicação que nos tivessem dito o que o mundo é; como se estivéssemos acabando de nascer para o mundo e para nós mesmos e precisássemos perguntar o que é, por que é e como é o mundo, e precisássemos perguntar também o que somos, por que somos e como somos”.

Observamos que a filosofia não deixa escapar nem o próprio pensamento, nem aquele que o exercita. Logo, ela se realiza como reflexão, ou seja, busca compreender nossa capacidade de conhecer, busca pensar sobre nossa capacidade de pensar.

“(...) a palavra [reflexão] é usada na Filosofia para significar movimento de volta sobre si mesmo ou movimento de retorno a si mesmo. A reflexão filosófica é o movimento pelo qual o pensamento, examinando o que é pensado por ele, volta-se para si mesmo como fonte desse pensado. É o pensamento interrogando-se a si mesmo ou pensando-se a si mesmo. É a concentração mental em que o pensamento volta-se para si próprio para examinar, compreender e avaliar suas idéias, suas vontades, seus desejos e sentimentos”.

“A filosofia não é ciência: é uma reflexão sobre os fundamentos da ciência, isto é, sobre procedimentos e conceitos científicos. Não é religião: é uma reflexão sobres os fundamentos da religião, isto é, sobre as causas, origens e formas das crenças religiosas. Não é arte: é uma reflexão sobre os fundamentos da arte, isto é, sobre os conteúdos, as formas, as significações das obras de arte e do trabalho artístico. Não é sociologia nem psicologia, mas a interpretação e avaliação crítica dos conceitos e métodos da sociologia e da psicologia. Não é política, mas interpretação, compreensão e reflexão sobre a origem, a natureza e as formas de poder e suas mudanças. Não é história, mas reflexão sobre o sentido dos acontecimentos enquanto inseridos no tempo e compreensão do que seja o próprio tempo”.

É interessante ressaltar que não somos apenas seres pensantes. Assim, a reflexão filosófica (realidade interior dos seres humanos) também tem como objetos de indagação o pensamento, o sentimento, a linguagem e a ação e podem ser resumidas em o que é pensar, sentir, falar e agir? Ou seja, “Por que é?” (a origem: quais os motivos, as razões e as causas); “O que é?” (a essência: que é o conteúdo ou o sentido), “Como é?” (a significação ou estrutura) e “Para quê é?” (a finalidade: qual é a intenção) do que pensamos, sentimos, dizemos e fazemos, ou seja, volta-se para os seres humanos.

“(...) Somos também seres que agem no mundo, que se relacionam com os outros seres humanos, com os animais, as plantas, as coisas, os fatos e acontecimentos, e exprimimos essas relações tanto por meio da linguagem e dos gestos como por meio de ações, comportamentos e condutas. A reflexão filosófica também se volta para compreender o que se passa em nós nessas relações que mantemos com a realidade circundante, para o que dizemos e para as ações que realizamos”.

Tendo o pensamento de Marilena Chauí como suporte, a Filosofia é fundamentação teórica e crítica dos conhecimentos e das práticas. A Filosofia ocupa-se com os princípios, as causas e condições do conhecimento que pretenda ser racional e verdadeiro; com a origem, a forma e o conteúdo dos valores éticos, políticos, religiosos, artísticos e culturais; com a compreensão das causas e das formas de ilusão e do preconceito no plano individual e coletivo; com os princípios, as causas e condições das transformações históricas dos conceitos, das idéias, dos valores e das práticas humanas. Por isso a Filosofia volta-se para o estudo das várias formas de conhecimento (percepção, imaginação, memória, linguagem, inteligência, experiência, reflexão) e dos vários tipos de atividades interiores e comportamentos externos dos seres humanos como expressões de vontade, do desejo e das paixões, procurando descrever as formas e os conteúdos dessas formas de conhecimento e desses tipos de atividade e comportamento como relação do ser humano com o mundo, consigo mesmo e com os outros.

“A atividade filosófica é, portanto, uma análise (das condições e princípios do saber e da ação, isto é, dos conhecimentos, da ciência, da religião, da arte, da moral, da política e da história), uma reflexão (volta do pensamento sobre si mesmo para conhecer-se como capacidade para o conhecimento, a linguagem, o sentimento e a ação) e uma crítica (avaliação racional para discernir entre a verdade e a ilusão, a liberdade e a servidão, investigando as causas e condições das ilusões e dos preconceitos individuais e coletivos, das ilusões e dos enganos das teorias e práticas científicas, políticas e artísticas, dos preconceitos religiosos e sociais, da presença e difusão de formas de irracionalidade contrárias ao exercício do pensamento, da linguagem e da liberdade). Essas três atividades (análise, reflexão e crítica) estão orientadas pela elaboração filosófica de idéias gerais sobre a realidade e os seres humanos. Portanto, para que essas três atividades se realizem, é preciso que a Filosofia se defina como busca do fundamento (princípios, causas e condições) e do sentido (significação e finalidade) da realidade em suas múltiplas formas, indagando o que essas formas de realidade são, como são e por que são, e procurando as causas que as fazem existir, permanecer, mudar e desaparecer”.

Para mim, a Filosofia é o exercício da razão em busca do conhecimento, da liberdade e da felicidade, fazendo do ser humano a conjugação inter-relacionada de quatro verbos: pensar, sentir, falar e agir. Então é algo para lá de útil, por isso a amo. Aliás, como mais uma vez diz Marilena Chauí:

“Se abandonar a ingenuidade e os preconceitos do senso comum for útil; se não se deixar guiar pela submissão às idéias dominantes e aos poderes estabelecidos for útil; se buscar compreender a significação do mundo, da cultura, da história for útil; se conhecer o sentido das criações humanas nas artes, nas ciências e na política for útil; se dar a cada um de nós e à nossa sociedade os meios para serem conscientes de si e de suas ações numa prática que deseja a liberdade e a felicidade para todos for útil, então podemos dizer que a Filosofia é o mais útil de todos os saberes de que os seres humanos são capazes”.

A partir do texto e dessa pergunta, deixe o seu comentário, filosofando: “O que pensamos, dizemos e fazemos em nossas crenças cotidianas constitui ou não um pensamento verdadeiro, um sentimento intenso, uma linguagem coerente e uma ação dotada de sentido?”. Para você, o que é Filosofia?

Um forte abraço!
Neilton Lima.