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“[...] acho que todo conhecimento deveria estar em uma zona de livre comércio. Seu conhecimento, meu conhecimento, o conhecimento de todo o mundo deveria ser aproveitado. Acho que as pessoas que se recusam a usar o conhecimento de outras pessoas estão cometendo um grande erro. Os que se recusam a partilhar seu conhecimento com outras pessoas estão cometendo um erro ainda maior, porque nós necessitamos disso tudo. Não tenho nenhum problema acerca das ideias que obtive de outras pessoas. Se eu acho que são úteis, eu as vou movendo cuidadosamente e as adoto como minhas” ("O caminho se faz caminhando - conversas sobre educação e mudança social", Paulo Freire e Myles Horton: p. 219).

domingo, 1 de janeiro de 2012

Filosofia: o amor à sabedoria.

Por Neilton Lima
Professor, pedagogo e especialista em psicopedagogia.
A função da filosofia é desbanalizar a vida. Para isso, ela nos leva a tomar distância da vida cotidiana e de nós mesmos, interrogando sobre nós, as coisas e o mundo, desejando conhecer por que cremos no que cremos, por que sentimos o que sentimos e o que são nossas crenças e nossos sentimentos. Sua investigação ocupa o lugar das certezas cotidianas. A indagação e o questionamento tornam a realidade e seus fatos estranhos, espantosos, algumas vezes incompreensíveis e enigmáticos. Partindo desse momento de abalo das opiniões estabelecidas, a filosofia mergulha o sujeito curioso na profundidade dos grandes pensadores.
O pensamento filosófico é racional, crítico, radical e sistemático. A filósofa Marilena Chauí diz por quê:


“Por que racionais? Por três motivos principais: em primeiro lugar, porque racional significa argumentado, debatido e compreendido; em segundo, porque racional significa que, ao argumentar e debater, queremos conhecer as condições e os pressupostos de nossos pensamentos e os dos outros; em terceiro, porque racional significa respeitar certas regras de coerência do pensamento para que um argumento ou um debate tenham sentido, chegando a conclusões que podem ser compreendidas, discutidas, aceitas e respeitadas por outros”.

“A palavra ‘crítica’ vem do grego e possui três sentidos principais: 1) capacidade para julgar, discernir e decidir corretamente; 2) exame racional de todas as coisas sem preconceito e sem pré-julgamento; 3) atividade de examinar e avaliar detalhadamente uma idéia, uma valor, um costume, um comportamento, uma obra artística ou científica. A atitude filosófica é uma atitude crítica porque preenche esses três significados da noção de crítica, a qual, como se observa, é inseparável da noção de racional, que vimos anteriormente”.

“A reflexão filosófica é radical porque vai à raiz do pensamento, pois é um movimento de volta do pensamento sobre si mesmo para pensar-se a si mesmo, para conhecer como é possível o próprio pensamento ou o próprio conhecimento”.

“A palavra sistema vem do grego, significa um todo cujas partes estão ligadas por relações de concordância interna. No caso do pensamento, significa um conjunto de idéias internamente articuladas e relacionadas, graças a princípios comuns ou a certas regras e normas de argumentação e demonstração que as ordenam e as relacionam num todo coerente. Dizer que as indagações filosóficas são sistemáticas significa dizer que a Filosofia trabalha com enunciados precisos e rigorosos, busca encadeamentos lógicos entre os enunciados, opera com conceitos ou idéias obtidos por procedimentos de demonstração e prova, exige a fundamentação racional do que é enunciado e pensado (...)”.

Filosofar é articular as diversas áreas do conhecimento de forma racional, crítica, radical e sistemática e provocar fecundas discussões sobre o mundo das idéias e sobre a história do pensamento. É compreender que as idéias científicas, religiosas, artísticas, morais, políticas, e mesmo filosóficas, são determinadas pelas condições históricas em que aparecem e se transformam. É buscar e encontrar a ligação entre certas idéias e certos comportamentos, as relações entre essas idéias e esses comportamentos como se tivessem alguns princípios que os unissem ou relacionassem. Surgem temas caros para a reflexão que dialogam mutuamente, dentre eles: Razão, Verdade, Conhecimento, Ciência, Ética, Política, Arte, Técnica, Religião, Metafísica, História, Lógica etc.
É preciso astúcia para decifrar e interpretar os jogos e desafios postos pela vida. E tão importante quanto compreendê-los é compreender-se. A filosofia é essa fonte de astúcia que nos leva a desconfiar da realidade tal como ela nos apresenta e é apresentada, ampliando nosso conhecimento sobre as coisas, sobre o mundo e sobre nós mesmos.

Logo, ela serve para informar, despertar o interesse pela cultura e o prazer da interrogação, provocar o raciocínio e a reflexão crítica. A filosofia nos traz a felicidade de ver as próprias coisas. Nesse sentido, ela, como o exercício do pensamento, nos liberta da ignorância ou nos impulsiona para a liberdade do pensar. Vejamos outra vez o que diz Chauí:

“Essa mudança de atitude indica algo bastante preciso: quem não se contenta com as crenças ou opiniões preestabelecidas, quem percebe contradições e incompatibilidade entre elas, quem procura compreender o que elas são e por que são problemáticas está exprimindo um desejo, o desejo de saber. E é exatamente isso o que, na origem, a palavra filosofia significa, pois, em grego, philosophía quer dizer “amor à sabedoria”.

Não existem preconceitos e crenças inquestionadas no campo filosófico. Há, sim, desconfiança das aparências das coisas, dos outros e de nós mesmos e a busca constante da realidade verdadeira, mesmo que para isso seja preciso lutar contra as condições adversas em que nos encontramos – pois o aprendizado chega a ser doloroso.  

Indagar é o verbo desconcertante e embaraçoso: qual é a origem, o sentido e a realidade de nossas crenças? Antes de tentar resolver os enigmas do mundo externo será mais proveitoso que comecemos por compreender a nós mesmos (Sócrates). Quando uma crença contradiz outra ou parece incompatível com outra, ou quando aquilo em que sempre acreditamos é contrariado por uma outra forma de conhecimento, entramos em crise. A filosofia se interessa por esses momentos críticos no pensamento, na linguagem e na ação, pois é nesses momentos que se manifesta mais claramente a exigência de fundamentação das idéias, dos discursos e das práticas.
 Quando sistemas religiosos, éticos, políticos, científicos e artísticos estabelecidos se envolvem em incoerências, ambigüidades ou incompatibilidades internas e contradizem-se uns aos outros e buscam transformações e mudanças cujo sentido ainda não está claro e precisa ser compreendido, o desejo de saber vai em direção à atitude filosófica. Segundo Cahuí:

“O que está por trás de tais perguntas? O fato de que estamos mudando de atitude. Quando o que era objeto de crença aparece como algo contraditório ou problemático e por isso se transforma em indagação ou interrogação, estamos passando da atitude costumeira à atitude filosófica”.

A atitude filosófica (realidade externa dos seres humanos) é também uma atitude crítica porque possui duas faces: uma negativa e outra positiva. Na primeira, como vimos, é um dizer “não” aos “pré-conceitos” e aos “pré-juízos”, aos fatos e às idéias da experiência cotidiana, ao estabelecido, interrogando suas causas e buscando o seu sentido. É positiva como interrogação. Assim, as características básicas da atitude filosófica são: 1) a pergunta “o que é?”, ou seja, qual é a realidade ou a significação de algo; 2) a pergunta “como é?”, ou seja, como é a estrutura ou o sistema de relações que constitui a realidade de algo; 3) a pergunta “por que é?”, ou seja, o motivo de algo existir, qual é a sua origem ou a sua causa. Esse “algo” pode vir a ser uma coisa, uma idéia, um valor ou um comportamento, ou seja, dirige-se ao mundo que nos rodeia e aos seres humanos que nele vivem e com ele se relacionam.


A interrogação sobre o mundo, sobre as coisas e sobre si mesmo nasce do desejo de conhecê-lo, conhecê-las e conhecer-se. É um espantar-se com o pensamento e pelo pensamento:

“(...) por meio de nosso pensamento, tomamos distância do nosso mundo costumeiro, olhando-o como se nunca o tivéssemos visto antes, como se não tivéssemos tido família, amigos, professores, livros e outros meios de comunicação que nos tivessem dito o que o mundo é; como se estivéssemos acabando de nascer para o mundo e para nós mesmos e precisássemos perguntar o que é, por que é e como é o mundo, e precisássemos perguntar também o que somos, por que somos e como somos”.

Observamos que a filosofia não deixa escapar nem o próprio pensamento, nem aquele que o exercita. Logo, ela se realiza como reflexão, ou seja, busca compreender nossa capacidade de conhecer, busca pensar sobre nossa capacidade de pensar.

“(...) a palavra [reflexão] é usada na Filosofia para significar movimento de volta sobre si mesmo ou movimento de retorno a si mesmo. A reflexão filosófica é o movimento pelo qual o pensamento, examinando o que é pensado por ele, volta-se para si mesmo como fonte desse pensado. É o pensamento interrogando-se a si mesmo ou pensando-se a si mesmo. É a concentração mental em que o pensamento volta-se para si próprio para examinar, compreender e avaliar suas idéias, suas vontades, seus desejos e sentimentos”.

“A filosofia não é ciência: é uma reflexão sobre os fundamentos da ciência, isto é, sobre procedimentos e conceitos científicos. Não é religião: é uma reflexão sobres os fundamentos da religião, isto é, sobre as causas, origens e formas das crenças religiosas. Não é arte: é uma reflexão sobre os fundamentos da arte, isto é, sobre os conteúdos, as formas, as significações das obras de arte e do trabalho artístico. Não é sociologia nem psicologia, mas a interpretação e avaliação crítica dos conceitos e métodos da sociologia e da psicologia. Não é política, mas interpretação, compreensão e reflexão sobre a origem, a natureza e as formas de poder e suas mudanças. Não é história, mas reflexão sobre o sentido dos acontecimentos enquanto inseridos no tempo e compreensão do que seja o próprio tempo”.

É interessante ressaltar que não somos apenas seres pensantes. Assim, a reflexão filosófica (realidade interior dos seres humanos) também tem como objetos de indagação o pensamento, o sentimento, a linguagem e a ação e podem ser resumidas em o que é pensar, sentir, falar e agir? Ou seja, “Por que é?” (a origem: quais os motivos, as razões e as causas); “O que é?” (a essência: que é o conteúdo ou o sentido), “Como é?” (a significação ou estrutura) e “Para quê é?” (a finalidade: qual é a intenção) do que pensamos, sentimos, dizemos e fazemos, ou seja, volta-se para os seres humanos.

“(...) Somos também seres que agem no mundo, que se relacionam com os outros seres humanos, com os animais, as plantas, as coisas, os fatos e acontecimentos, e exprimimos essas relações tanto por meio da linguagem e dos gestos como por meio de ações, comportamentos e condutas. A reflexão filosófica também se volta para compreender o que se passa em nós nessas relações que mantemos com a realidade circundante, para o que dizemos e para as ações que realizamos”.

Tendo o pensamento de Marilena Chauí como suporte, a Filosofia é fundamentação teórica e crítica dos conhecimentos e das práticas. A Filosofia ocupa-se com os princípios, as causas e condições do conhecimento que pretenda ser racional e verdadeiro; com a origem, a forma e o conteúdo dos valores éticos, políticos, religiosos, artísticos e culturais; com a compreensão das causas e das formas de ilusão e do preconceito no plano individual e coletivo; com os princípios, as causas e condições das transformações históricas dos conceitos, das idéias, dos valores e das práticas humanas. Por isso a Filosofia volta-se para o estudo das várias formas de conhecimento (percepção, imaginação, memória, linguagem, inteligência, experiência, reflexão) e dos vários tipos de atividades interiores e comportamentos externos dos seres humanos como expressões de vontade, do desejo e das paixões, procurando descrever as formas e os conteúdos dessas formas de conhecimento e desses tipos de atividade e comportamento como relação do ser humano com o mundo, consigo mesmo e com os outros.

“A atividade filosófica é, portanto, uma análise (das condições e princípios do saber e da ação, isto é, dos conhecimentos, da ciência, da religião, da arte, da moral, da política e da história), uma reflexão (volta do pensamento sobre si mesmo para conhecer-se como capacidade para o conhecimento, a linguagem, o sentimento e a ação) e uma crítica (avaliação racional para discernir entre a verdade e a ilusão, a liberdade e a servidão, investigando as causas e condições das ilusões e dos preconceitos individuais e coletivos, das ilusões e dos enganos das teorias e práticas científicas, políticas e artísticas, dos preconceitos religiosos e sociais, da presença e difusão de formas de irracionalidade contrárias ao exercício do pensamento, da linguagem e da liberdade). Essas três atividades (análise, reflexão e crítica) estão orientadas pela elaboração filosófica de idéias gerais sobre a realidade e os seres humanos. Portanto, para que essas três atividades se realizem, é preciso que a Filosofia se defina como busca do fundamento (princípios, causas e condições) e do sentido (significação e finalidade) da realidade em suas múltiplas formas, indagando o que essas formas de realidade são, como são e por que são, e procurando as causas que as fazem existir, permanecer, mudar e desaparecer”.

Para mim, a Filosofia é o exercício da razão em busca do conhecimento, da liberdade e da felicidade, fazendo do ser humano a conjugação inter-relacionada de quatro verbos: pensar, sentir, falar e agir. Então é algo para lá de útil, por isso a amo. Aliás, como mais uma vez diz Marilena Chauí:

“Se abandonar a ingenuidade e os preconceitos do senso comum for útil; se não se deixar guiar pela submissão às idéias dominantes e aos poderes estabelecidos for útil; se buscar compreender a significação do mundo, da cultura, da história for útil; se conhecer o sentido das criações humanas nas artes, nas ciências e na política for útil; se dar a cada um de nós e à nossa sociedade os meios para serem conscientes de si e de suas ações numa prática que deseja a liberdade e a felicidade para todos for útil, então podemos dizer que a Filosofia é o mais útil de todos os saberes de que os seres humanos são capazes”.

A partir do texto e dessa pergunta, deixe o seu comentário, filosofando: “O que pensamos, dizemos e fazemos em nossas crenças cotidianas constitui ou não um pensamento verdadeiro, um sentimento intenso, uma linguagem coerente e uma ação dotada de sentido?”. Para você, o que é Filosofia?

Um forte abraço!
Neilton Lima.

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