1. Quanto
a polarização nacional vai interferir nas eleições municipais?
Qual é o peso que Lula e Bolsonaro terão
nas campanhas de 2024? Até que ponto conseguirão transformar a corrida por
prefeituras e câmaras de vereadores em um “terceiro
turno” das eleições de 2022, a mais acirrada desde a redemocratização?
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Haverá
um peso de temas locais.
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O
embate entre Lula e Bolsonaro se concentrará nas metrópoles.
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Os
dois buscam pautar disputas em grandes centros e ampliar sua base de prefeitos.
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A
importância da questão local é uma lei de ferro nas eleições municipais,
difícil de ser quebrada. Logo, há dúvidas sobre a capacidade de figuras
nacionais ditarem a agenda de eleições que, via de regra, se voltam para temas
locais. O TP vai tentar um “efeito
Lula”, mas isso não ocorre em todas as regiões. E a agenda de valores mobilizada pelo
bolsonarismo pode ser muito abstrata no contexto dos municípios.
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A
polarização pode ter papel significativo, mas em diferentes perfis de disputas.
A polarização deve ser mais decisiva nas metrópoles, e o debate deve se
concentrar nas gestões locais nas cidades pequenas e em regiões em que o voto
foi mais homogêneo na eleição presidencial.
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Nas
metrópoles, é o prefeito que pode vetar ou dar vazão aos debates sobre as
escolas municipais abordarem sexualidade ou não, sobre qual vai ser o livro
utilizado. A polarização vai chegar nas eleições municipais.
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Há
expectativas de nacionalização em 2024, quanto da intenção de lideranças
nacionais de assumirem as rédeas da campanha.
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A
eleição de SP é o terceiro turno de 2022. Lula teve mais votos do que Bolsonaro
na cidade, e entende que se vencer ali de novo sai fortalecido para 2026.
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Bolsonaro
e Lula têm influência, mas sozinhos não elegem prefeitos. Em muitos casos, vai
depender do patamar de rejeição desses gestores.
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Para
alimentar rejeição entre si, será forte outra vez a agenda de costumes, que
costuma ser mobilizada em municípios menores, sob o formato de “campanha suja”.
Isso se mistura a uma dinâmica quase de fofoca, mas tem efetividade grande.
2. Disputas
na base vão afetar a governabilidade da gestão Lula?
As disputas
entre partidos da base de Lula, que se enfrentarão em 22 das 26
capitais, vão respingar na governabilidade do presidente?
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Há
movimentação de integrantes de partidos da base de Lula que ensaiam embates na
maioria das capitais. É preciso evitar atritos que afetem a governabilidade.
Afinal, entreveros em disputas municipais já tiveram impacto em alianças
partidárias nacionais. Acenos do PT a siglas de esquerda e do Centrão sugerem
preocupação em blindar o governo de eventuais fissuras nos municípios.
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É
preciso cautela em cidades onde mais de um partido da base lançar candidato.
Esta será a situação de 22 das 26 capitais (as exceções são BH, Manaus, Macapá
e Porto Velho).
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O
PT tende a evitar campanhas “com sangue nos olhos” mesmo em capitais onde estiver
disposto a enfrentar aliados.
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O
PT, ao tentar ampliar sua base de prefeitos a reboque da volta do partido à
Presidência da República, pode entrar em conflito com interesses locais de
aliados, com risco de eventuais fissuras na base governista. A briga para
abrigar nomes vistos com potencial eleitoral é mais um foco de tensão na
coalizão de 13 siglas que apoiam o governo.
3. Quais
temas vão pautar as campanhas nas cidades?
Praticamente certo é que temas ligados à oferta de serviços públicos, e não a
política nacional, vão pautar as campanhas. A agenda é mais concreta e conectada com a vida cotidiana nas cidades.
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Meio
ambiente, geralmente visto como uma questão mais nacional, é citado, devido às
recentes ondas de calor e as fortes chuvas.
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A
mobilidade urbana (incluindo a tarifa zero, ônibus lotados, cidade e sua conservação), saúde (embora não seja uma atribuição dos municípios) e segurança pública. Debates sobre privatizações do acesso à água e das empresad de energia.
4. A
inteligência artificial vai turbinar a propagação das fake news?
E, na primeira eleição brasileira após a popularização de ferramentas de IA, resta saber se
essas novas tecnologias vão potencializar a disseminação de fake news. Quais as
formas de combatê-las?
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Mais
da metade dos brasileiros (51%) acredita que a inteligência artificial deve
agravar a disseminação de fake news entre a população (pesquisa Ipsos). Por
aqui, 74% das pessoas avaliam que esse tipo de tecnologia já contribui para a
criação de imagens e histórias falsas, independentemente do que venha a
acontecer no futuro. Ainda assim, entre os brasileiros, 72% têm confiança de
que são capazes de discernir uma notícia verdadeira de uma falsa – o índice
está acima da média global, de 66%.
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Primeira
eleição brasileira após popularização da IA será ‘laboratório’ para possível
manipulação de vídeos, textos, áudios e imagens (para plataformas como
Instagram, TikTok, WhatsApp); estudiosos defendem aplicação da mesma tecnologia
para combater seu mau uso. Elas podem ajudar a reduzir custos e automatizar
peças de propaganda, e tornam mais complexas as campanhas de desinformação, ao
produzirem conteúdos que são mais difíceis de se detectar como falsos ou
editados.
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Quanto
à disseminação de desinformação, uma das principais preocupações é com os
chamados deepfakes, vídeos que, em geral, combinam falas a imagens já
existentes. Teremos montagens, deepfakes e uso de IA para manipulação de
imagens e informações de forma mais generalizada. Você consegue fazer criações
ou alterações de contexto de uma forma muito mais simplificada.
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O
exemplo argentino: IA utilizada para produzir materiais de campanha. Um caso com
ampla repercussão foi o de um vídeo manipulado em que inseriu o rosto de Massa
no lugar do de outro homem que aprecia em imagens de 2016 cheirando um pó
branco. O objetivo era associar o candidato, que acabou derrotado, ao uso de
cocaína. Mais recentemente, uma imagem falsa mostrou Milei ajoelhado diante do
presidente da China, Xi Jinping.
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Há
espaço para o uso de Ias em tarefas e estratégias menos visíveis das campanhas,
como o direcionamento de propaganda e a criação de chat bots para interagir com
eleitores ou para alimentar contas falsas.
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A
disputa municipal é uma eleição de teste por ser mais pulverizada. Logo,
monitorar casos de desinformação associados ao uso dessas novas tecnologias
será um desafio ainda maior no contexto dos pleitos municipais. A disputa em
2024 é mais capilarizada e há diferenças nas estruturas dos tribunais regionais
eleitorais nos estados. Nenhuma campanha vai viralizar por conta própria. Terá
que gastar com internet ou ter um alvo.
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A
disputa municipal é um “aquecimento” para 2026. O impacto pode ser mais
evidente nas grandes cidades, em que há candidatos com maior estrutura para
investir nessas tecnologias. Do ponto de vista das instituições, será preciso
buscar formas de aplicar a própria tecnologia para detectar seu uso. “Você tem
que criar máquinas de IA para ajudar na checagem do uso da IA para distorcer o
processo eleitoral (práticas antiéticas e ilegais)”.
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A
experimentação com Ias pelas campanha já deve ocorrer logo no primeiro semestre,
período que servirá como um termômetro para as eleições.
Enfim, o Congresso precisa criar
urgentemente uma legislação específica para responsabilizar quem utiliza a
tecnologia para tentar influenciar de forma irregular o voto de eleitores. A
lei também precisa ser mais rígida e célere, provocando a cassação e
inelegibilidade de candidatos que utilizarem IA para desvirtuar o debate
eleitoral.