“O quanto ‘o despertar’ pode resistir e prosperar sem poder político direto? Afinal, essa chama, acima de tudo, é um movimento cultural. Os socialistas que não têm um caminho para controlar os meios de produção estão sempre em perigo de se transformarem num clube privado de debates”.
“Já a direita pós-liberal só deseja outra oportunidade democrática, então está sempre pronta e tramando. Estará sempre fazendo promessas nacionalistas frente a imigração inevitável, grandes ideias (e tarifas) para a política industrial e familiar; um conservadorismo social revivido que se opõe ao excesso libertário”.
Nos últimos anos, houve um repentino aumento de ambição ideológica de direita e de esquerda. De um lado, “uma nova direita” contra, do outro lado, algum tipo de esquerda pós-neoliberal ou uma insurgência socialista.
A reação foi imediata e, rapidamente, pensadores conservadores correram para preencher os contornos do populismo, construindo vários arcabouços intelectuais para uma incipiente era pós-liberal.
Entre os progressistas, havia
dois grandes projetos:
1.
Uma revolução cultural em
nome do antirracismo e da justiça social;
2. Um renascimento de grandes projetos de gastos social-democratas.
Entre os conservadores, uma
bajulação inconsistente:
1.
Corte de impostos para alguns, maconha legalizada para outros;
2. Deportação em massa e tratamento gratuito de fertilização in vitro.
O que a atual temporada eleitoral está entregando? Seja o que for, não é um grande debate ideológico, mas sua fuga de ambos os lados. Isso quer dizer que as labaredas estão diminuindo, mas a chama continua acesa.
Enquanto a esquerda sofre com um curto-circuito identitário em seus quadros culturais de progressismo (uma pequena força guerrilheira), a direita aposta num movimento cultural que está construindo numa espécie de educação clássica, com gurus, intelectuais, CEOS e até professores com bases em universidades (veja o Brasil Paralelo, por exemplo).
Quais visões de mundo ganharão terreno na campanha de 2024? E para isso que terá eleição. Por enquanto, as ideias de antes sofreram um grande choque tecnológico de revisão e de inovação. Nacos de política progressista de pequena escala, economia de oferta, libertarianismo cultural, cortes de impostos, créditos fiscais, direitos ao aborto, gente gabando de possuir uma arma, outra endossando a maconha legal e muito perdido nas redes. É primavera para quem, neoliberalismo ou socialismo?
Enfim, a política está aí, mais como um
ajuste de contas do que como algo novo que venha de fato melhorar a vida das
pessoas. Na esquerda, o bom debate sem o poder político; na direita, o poder
político sem conseguir concordar com o que defendem porque de fato é um absurdo
– fixando uma ideia, boiando em paranoias e desiludindo em prol do capital.
NOTAS COMPLEMENTARES:
- líderes estão voltando,
cautelosamente, à neutralidade política;
- o despertar que varreu instituições de
justiça social tem uma mistura de recuo e consolidação – não está incendiado
mas também não desistiu de todo o território que reivindicou.
- há um eclipse woke no uso de palavras
de ordem ideologizada na mídia e na academia, com tendência de estabilização ou
diminuição modesta, mas não um declínio real. Isso sugere que o despertar está
mais em suspenso do que em plena retirada.
- o neossocialismo conquistou algumas vitórias políticas, mas parece sem rumo como movimento voltado para o futuro, com suas grandes ambições frustradas pelo governo misto ou dividido. O sonho de uma renda básica universal ou de um estado de bem-estar de escala europeia parece meio distante.
·
A esquerda já foi muito forte, chegou a eleger 15 prefeitos de
capitais em 2007, mas enfraqueceu.
· A gente vem observando um endireitamento do Brasil desde 2018. Tanto que agora, partidos do Centrão e PL lideram em candidaturas competitivas nas capitais. Pontos à frente! Ou seja, candidatos filiados a partidos do Centrão e que se posicionam à direita no espectro político têm aparecido mais bem posicionados em pesquisas de intenção de voto para prefeito nas capitais que nomes do campo de esquerda.
·
Repare que o União Brasil, fruto da fusão entre DEM e PSL, e o PL,
do ex-presidente JB, são as legendas com mais representantes entre os 55
candidatos pelo país que se mostram competitivos nos levantamentos, isto é, com
chances hoje de vencer em primeiro turno ou disputar o segundo. Os partidos têm
11 e 9 nomes nessas condições, respectivamente. Eles são seguidos pelo PSD, com
7 candidatos na lista.
·
O MDB, que tem perdido espaço nas maiores cidades e aposta em Ricardo
Nunes em São Paulo, e o PT, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que não
elegeu prefeito em capitais no pleito passado, aparecem em seguida, com 6
candidaturas cada.
·
56% dos postulantes a prefeito mais competitivos se declaram de
direita, enquanto 21% se apresentam como de centro e 23% como de esquerda.
Nomes do União Brasil e do PL aparecem com vantagem mesmo em cidades do
Nordeste, tradicional reduto petista em pleitos presidenciais. Na busca pela
reeleição, os prefeitos de Salvador, Bruno Reis (União Brasil), e de Maceió,
JHC (PL), alcançam 74% das intenções de voto. A gente vem observando
um endireitamento do Brasil desde 2018. Há um esvaziamento do Centro, enquanto
a população está migrando para o extremo da direita, que se organizou melhor. A
esquerda não investiu em novos nomes, não apresentou alternativas tendo em
vista 2024. Após não eleger nenhum prefeito em 2020 nas capitais pela primeira
vez desde a redemocratização, o PT enfrenta desafios para retomar os executivos
municipais, mesmo à frente do governo federal. As dificuldades ocorrem porque a
eleição presidencial de Lula não foi motivada por um fortalecimento da esquerda
junto aos eleitores, mas por uma união de uma frente ampla contra o
bolsonarismo. Mesmo que Lula tenha vencido as eleições, os governadores são de
direita e os prefeitos também. A esquerda já foi muito forte, chegou a eleger
15 prefeitos de capitais em 2007, mas enfraqueceu. A base popular está desorganizada e os movimentos
populares se esvaziaram.
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