Tema da festa: “Capital Afro”.
Refutar e Macetar!
O carnaval de Salvador voltou às suas origens, com públicos diferentes, mas igualmente apaixonados pela diversidade musical e cultural. Nossa energia ancestral voltou vermelhinha. Uma folia democrática que promete devolver o carnaval para aqueles que mais o merecem de direito – o povo!
Ivete Sangalo, dona do hit do ano em conjunto com Ludmilla, recebendo em seu trio Baby do Brasil, que já foi Consuelo, travando o diálogo-síntese não só do Carnaval de 2024, mas do momento atual do Brasil.
O fato de o carnaval ser o sucesso que é, em diversas
manifestações – só o carnaval de rua tem configurações absolutamente próprias
como o daqui da Bahia –, a despeito da crônica desorganização, desses debates políticos
de quinta categoria e da infiltração da contravenção e do crime justamente onde
o poder público falha, mostra o quanto o país poderia alavancar seu
desenvolvimento se desse a essa e outras expressões da brasilidade o caráter de uma prioridade, e não de um feriado a mais
no calendário.
A volta do carnaval verdadeiro está diretamente associada a três grandes movimentos que este ano completam uma década: 1. O Furdunço (aquecimento da folia, idealizado para fazer com que os turistas chegassem mais cedo a Salvador e garantir a permanência de soteropolitanos na cidade, ficando imune às pressões da indústria); 2. Navio Pirata da BaianaSystem (arrastar multidões e promover a redemocratização do carnaval e uma chama de resistência: raiz, democrático e libertador).
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dias corridos de muita diversão!!! Tem que ter fôlego, disposição, saúde e
dinheiro para aguentar a maratona de festas soteropolitanas. Elas começaram com
a Lavagem do Bonfim (em janeiro). O feriado de Carnaval é celebrado hoje, dia
13/02. Amanhã, Quarta-feira de Cinzas terá o tradicional arrastão (na
Barra-Ondina, puxado por: Carlinhos Brown, Ilê Aiyê, Olodum e Bell Marques). E agora ainda terá a primeira edição do 3. VIVA VERÃO: festival
gratuito que começará nesta sexta e seguirá até o dia 24, na Praça Cairu, no
Comércio. Será 18 atrações locais e nacionais, e tem como objetivo reter os
turistas que visitam a cidade, assim como atrair aqueles que querem conhecer a
primeira capital do país.
Salvador foi apontada como o destino turístico mais desejado do Brasil para 2024, com uma média de interesse de 7.1 numa escala de 0 a 10 (pesquisa Ministério do Turismo), com folia tranquila e sem grandes contratempos do ponto de vista da segurança pública e também do ponto de vista de estrutura. Segue tudo sob controle!
Carnaval baiano: 1. Artistas famosos solo nos circuitos em seus trios elétricos: Ivete Sangalo, Daniela Mercury, Claudia Leitte, Margareth Menezes, Bell Marques, Durval Lelys, Léo Santana, Xanddy Harmonia, Carlinhos Brouwn e Luiz Caldas são alguns dos nomes. 2. Blocos-afro de representação de resistência e cultura negra: Olodum, Filhos de Gandhy, Ilê Aiyê. 3. Bandas: Armandinho, Dodô, Osmar, Banda Eva, Cheiro de Amor, Psirico, É o Tchan, Timbalada, BaianaSystem. Enfim, a capital afro. Nossa energia é ancestral! O carnaval deve ser assim: nada de caretice, nada de freio, nada de pensar duas vezes, afinal só se vive uma. Tem coisas que não têm a menor lógica, ainda mais por estes dias de carnaval.
Pontos críticos:
· Carnaval e vulnerabilidade social. Apesar de o carnaval movimentar R$ 9 bilhões, há uma economia invisível. É aquela impulsionada pelos catadores, que costumam receber valores irrisórios vasculhando em busca de latas, plástico e papéis. O tamanho do desafio é imenso: 32 milhões de pessoas passam fome no Brasil, o equivalente a 412 mil ônibus lotados, e aproximadamente 1 milhão de catadores. Enfim, muitos se divertindo, outros trabalhando de fio a pavio na luta pelas latinhas. Alguns empregos bem questionáveis, por submeter homens e mulheres a jornadas longas e quase desumanas.
· Poucos viram
suas fortunas aumentando, com a venda de abadás, camarotes, blocos, patrocínio
comercial, shows e imagens na rede social.
· Quando a festa
terminar, as contas começam a chegar para os menos aquinhoados: anuidade
escolar, IPTU, IPVA, cartões com limites estourados, cheque especial vermelhão,
etc.
· O carnaval
também deu uma acalmada nas investigações sobre a tentativa frustrada da
direita ensandecida em dar um golpe nas eleições de 2022, ferindo todas as
regras democráticas.
· Precisamos
resgatar a alegria original do nosso carnaval e do nosso futebol. Nos últimos anos,
a violência tomou a paz de nossas manifestações culturais mais genuínas. Não
vejo por que não ver novamente a paz no futebol. Darmos um exemplo para o
mundo. O baiano que faz o melhor Carnaval do mundo também é capaz de ir ao
estádio ver seu maior clássico em paz!
· Tradição: público aprova o aumento das atrações/trios sem corda e segue artistas que fizeram história. Em defesa de trios pequenos e da pipoca!!! Eis o carnaval real, original e democrático.
· Visão conservadora do carnaval: “Influenciadores” ou políticos bolsonaristas tentam classificar o carnaval como festa promíscua, destinada à destruição dos valores religiosos e familiares. Faz mais ou menos assim: a festa carnavalesca é chula, desprovida da verdadeira alegria da alma, tudo fragmenta e deturpa! A esfuziante alegria coletiva é a farsa universal, onde o sexo é mecânico, como um sazonal gosto passageiro, que ao invés de preencher, esvazia a alma, de maneira tão profunda, que as sequelas oriundas das iniquidades ficam indeléveis, como tatuagens, no sofrido espírito devassado! O corpo, esse coitado... Como um sacrário desrespeitado, se transforma num poço pútrido, de ejaculações, sem amor nem critérios, da esbórnia enlouquecida e desvairada, adeptos do gozo passageiro, daí... Floresce o sofrimento, advindo da irresponsabilidade coletiva, dessa tal de liberdade, que a libertinagem alardeia, como felicidade! O corpo nu, sagrado e receptáculo da vida é maculado e se torna promíscuo. Carnaval já foi uma festa de alegrias... Hoje é uma desmedida patifaria instituída, onde as frustrações campeiam, como se assim fossem, um esgoto, de regurgitações a céu aberto! Infelizmente!
· Os trios atualmente são imensos e estão ligados totalmente ao desenvolvimento
tecnológico, mas isso também tem afastado os artistas do seu público. Mais do
que se divertir e dançar, a festa sem equipamentos imensos ou cordas mostra
melhor o que o Carnaval nasceu para ser: o contato com o público, com
transmissão de emoção.
· O carnaval de
Salvador vinha grande, mas enfraquecido. Esse enfraquecimento fica na conta da
profissionalização da folia a qualquer custo. Das grandes marcas que, sem pedir
licença, se apossaram de espaços que não eram delas. Que em vez de aproximar,
criaram um abismo, excluindo e afastando da festa quem mais merecia estar lá: o
povo. Parte disso, graças ao loteamento ao qual as ruas de Salvador foram
submetidas, com camarotes luxuosos e megas estruturas que remetem a qualquer
coisa, menos às origens do carnaval. É preciso devolver o carnaval aos baianos
e aos turistas! Artistas que só tocavam dentro de excludentes cordas acordaram
e voltaram seus olhares novamente para a massa.
· A folia está de
novo nas mãos do povo! O Carnaval é a maior festa popular do planeta e umas das
mais importantes manifestações culturais brasileiras. Turbina a alegria,
impulsiona o turismo, gera renda e empregos.
· Letras
abordando questões sociais e reforçando mensagens. Repertório
consciente: “Justiça é cega”. “Lucro é máquina de louco”. “Especulação
imobiliária” e ganância na cidade. O direito de ir e vir, não construir prédios
nas costas. Arrastar o proletariado...
Bloco Mudança do Garcia.
“Carnaval sem mudança não é Carnaval. Aqui temos um ponto de encontro importante, onde as pessoas fantasiadas levam a mensagem de protesto e reivindicações”.
O “Mudança do Garcia” tem o primeiro registro conhecido, datado de 1926. A história oficial diz que começou como um movimento de ex-policiais dedicados a limpar as ruas do Garcia. Com o passar dos anos, o bloco evoluiu para além de sua função inicial, tornando-se um espaço sem cordas onde a comunidade pode expressar livremente suas preocupações sociais, políticas e culturais.
O bloco foi se consolidando como espaço que é, principalmente, na época da ditadura militar, onde não havia a liberdade de expressão e era a forma de, principalmente, movimentos sociais do partido de esquerda colocarem suas opiniões na sociedade, seja por faixa, cartazes ou alegorias e isso foi ao longo do tempo, se consolidando como um circuito alternativo.
O bloco é conhecido por fazer críticas políticas. Atrevimento, músicas e movimentos culturais. Mas, não só: manifestações e críticas, reclamações sobre temas diversos, fantasias e muita animação... Protestos irreverentes que fazem a mudança! Placas com piadas de cunho político. Assim, além de um festejo para o corpo e para os sentidos, o Carnaval no Garcia se mostra um festa para espírito crítico. A importância de dar visibilidade a questões cruciais durante o desfile, expor a dificuldade e a politicagem errada, as coisas erradas.
Irreverência e reivindicações sérias. Lembrando que, quem faz crítica passa de pedra a vidraça, também recebendo o teor dos protestos, porque é do jogo democrático.
Enfim, essa e outras lutas.
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