Dezembro é um mês de baixo astral travestido de “boas festas e feliz ano novo”. Vende-se um clima festivo, leva-se uma gincana insalubre.
Herdamos uma pandemia e um pesado processo eleitoral polarizado, com outro que já se anuncia. Relações de muita embalagem e pouco conteúdo, muito ódio e zero empatia. Compromissos colidindo em cadeia como em um engavetamento no trânsito: encurralados por dívidas, ressacas, engarrafamentos e uma lista de tarefas que bate todos os recordes, presos em uma fila interminável.
Dezembro é vermelho, e a cor aqui tem o mesmo significado do semáforo. Por quê? Porque convencionalmente é uma linha de chegada ofegante, onde quem consegue cruzar é forçado a fazer um balanço mental e emocional de tudo o que passamos. Isto é, nos submete a perdas e danos. Depressivos ficam mais depressivos, culpas e ressentimentos ficam mais realçados, vazios ficam mais escavados. Preencher com o quê? Um presente com verniz apenas para o comércio vender mais? Nada autêntico.
O mês de dezembro é uma farsa ornada por neve artificial, árvore verde, mas cortada, e luzes piscantes. Todo mundo cisma de se encontrar contra a vontade, como se fosse preciso amar à força, como se não houvesse um apocalíptico ano que vem. E é aí que o desejo de “boas festas” tem outra semântica. Não é a de celebrar, planejar, concluir metas e preservar tradições. É se reconfortar no calvário que criamos e que nos torna cansados e sobrecarregados.
Tudo isso prova empiricamente que o processo não está bom. Afinal, dezembro é um produto evasivo. Por isso há recusa de participar de amigos ocultos, há quebra de correntes natalinas no WhatsApp e na vida real, aquela desculpa esfarrapada do “ano que vem eu resolvo”, com o “ano que vem” sorrindo ironicamente logo ali. Então a gente chega de mãos abanando na ceia, porque esse se torna o melhor presente de Natal que você poderia se dar, quando não acontece aquela desculpa para furar prazos e confraternizações.
Talvez dezembro seja a época mais propícia do ano para simplesmente desistir. Desistir disso tudo que ele terrivelmente representa. Encará-lo de dentro. Porque é lá de dentro que resiste a VIDA.
Enfim, talvez a única coisa merecida de
celebrar no Natal seja a sobrevivência da minha mãe e a minha. E essa
consciência ainda de pé sobre esse mundo cruel, desumano e digitalmente
cretino. Ah, e tem também a vitória do Lula...
Feliz Natal e um Feliz Ano Novo!
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