A educação é esquizofrênica. Rachada em multiversos, há mundo para quem é livre para estudar e aprender, mundo para quem é tratado como desigual, mundo de sonhos, mundo vazio...
Seja para uns ou para outros, os bons tópicos de debate surgem do cotidiano. Ainda que eles não estejam conectados por um tema central, nem poderiam pela realidade fragmentada de que surgem; e ainda que nem todos queiram, aqui, neste texto, há um desejo coletivo de compreender como transformar a sala de aula em um lugar de engajamento forte e aprendizado intenso.
Como uma professora negra pode manter a autoridade na sala de aula sem que a enquadrem em estereótipos racistas e machistas, enxergando-a como uma “negra raivosa”? Como entender as lágrimas em sala de aula e também o humor? Podemos ou não aprender com pensadores e escritores racistas e machistas? Qual é o poder da história e o papel essencial da conversa no processo de aprendizagem? Qual é o espaço da imaginação dentro da sala de aula?
O lado perverso dos professores.
Quem pensa que todo professor é bonzinho está muito enganado. Há professores que têm como principal fonte de prazer na sala de aula o exercício do poder autoritário, esmagando nossos espíritos e desumanizando nossa mente e nosso corpo. Esses professores amam escolas segregadas, se acham detentores do conhecimento e estão ali só para preparar para uma profissão (e olhe lá!).
Eles acham que tudo se limita a desejo e vontade, pois, para eles, o mundo é feito só de sonhos. São racistas e muitos outros “istas”; gostam de desprezar e são indelicados; quando muito, só romantizam; alimentam muito as coisas mesquinhas desse mundo; acreditam que você não é humano; acham que pertencem a uma raça superior e que consideram outros incapazes de aprender; odeiam; o machismo confesso às vezes é mais duro do que o racismo velado; desejam manter as velhas hierarquias de raça, classe e gênero intactas (seus planos de aula estão cheios de rituais que asseguram sua manutenção); para eles, várias formas de abuso de poder são tidas como comuns e normais. Enfim, acreditam que alunos que trabalham longos turnos em subempregos se fazem escritores.
Felizmente, há professores preocupados em oferecer uma “boa educação”.
Esses, sim, são professores preocupados não apenas em oferecer conhecimento e preparar para uma profissão, mas também uma formação que incentive o compromisso contínuo com a justiça social, especialmente com a luta por igualdade racial. Para eles, um professor deve ser sempre humano; personificar um intelecto superior é tão necessário quanto uma moralidade ética à mesma altura; veem a escola como lugar onde o desejo de saber possa ser alimentado e crescer; desejam que seus alunos frequentem a faculdade. Para eles, o futuro possível não é apenas desejo e vontade, mas também pensamento, planejamento, conhecimento e organização (isto é, pedagogia engajada); conhecimento é sinônimo de conhecer a si mesmo, está ciente de sua situação difícil e saber como se proteger e lutar contra o preconceito. No objetivo do plano de aula está: guiar e mostrar o caminho para a liberdade; eles lutam por uma nova era de igualdade e educação democrática; amam dar aulas e acreditam que lecionar é a melhor profissão que um escritor pode ter; são progressitas e educam para a prática da liberdade; ajudam os estudantes a serem aprendizes autônomos. Eles mostram o poder do conhecimento; ensinam a amar o magistério alimentando os estudantes com autodesenvolvimento e autorrealização. Se tem alguma coisa que eles exploram são as conexões entre pedagogia engajada e questões de raça, gênero e classe social, assim como o impacto do trabalho de Paulo Freire em nossas reflexões. Esses professores também ensinam sobre ensino (a outros professores, estudantes e quem quer que seja); entra com dedicação no mundo público, tentando conferir paixão, habilidade e beleza absoluta à arte de ensinar. Fica óbvio para o público que ele pratica o que prega – a união entre teoria e práxis é um exemplo dinâmico para professores em busca de sabedoria prática. Eles abordam questões, simples ou complexas, a partir de pontos de vista diversos. Felizmente, há salas de aula onde determinados professores têm por objetivo educar como prática da liberdade. Nesses espaços, o pensamento, mais especificamente o pensamento crítico, é o que importa.
Enfim, no multiverso da educação, com seus professores mocinhos e bandidos, estão os melhores – aqueles que amam os estudantes e amam a sala de aula (o que é muito diferente de amar a situação de exploração, desigualdade e sucateamento do ensino). Afinal, dizer que o professor ama a educação, a sala de aula, os estudantes e seu ofício é bem diferente de acreditar, erroneamente, que o professor ama suas condições precárias de trabalho e sua desvalorização. Aqui residiria outra característica dos péssimos professores.
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