Um livro de Michel Foucault, A Vontade de Saber, assim resumido:
1)
Por
que reduzir a dominação à proibição, à censura, à repressão escancarada? Por
que só pensar no poder enquanto limitador,
dotado apenas do “poder do não”, produzindo exclusivamente a “forma negativa do interdito”? O poder é menos o
controlador de forças que seu produtor e organizador.
Desde o fim do Século XVI, o poder político é, antes de mais nada, a instância
que constitui os súditos sujeitos ao
dobrá-los a suas pedagogias disciplinares (ensino, exército, etc.).
2)
Se
esta verdade ainda passa desapercebida é porque, “no fundo, a representação do poder continua sendo obcecada pela monarquia”, e
pela representação jurídica que esta suscitou. Daí a
necessidade de “decifrar os mecanismos do poder” deixando de recorrer-se
à personagem do Príncipe. O poder é
instaurador de normas, mais que de leis.
3) Deixaremos, então, de representar o poder como uma instância estranha ao corpo social, e de opor o poder ao indivíduo. Afinal de contas, ainda é muito tranqüilizante interpretar o poder apenas como “um puro limite imposto à liberdade”. Representação que, além disto, é muito grosseira. Na verdade, encontramos as relações de poder funcionando em relações muito distintas na aparência: nos processos econômicos, nas relações de conhecimento, no intercurso sexual... De modo que, “no princípio das relações de poder, não existe, como matriz geral, uma oposição binária e global entre dominantes e dominados”.
Michel Foucault desenvolveu em Vigiar e Punir e n’A Vontade de Saber: o poder moderno não é mais, essencialmente, uma instância repressiva e transcendente (o rei acima dos seus súditos, o Estado superior ao indivíduo), mas uma instância de controle, que envolve o indivíduo mais do que o domina abertamente.
Podem diminuir as proibições, abolir-se
a pena de morte, abrandar-se o regime das prisões, etc... , porém o sistema
disciplinar, a que nos vemos submetidos até em nossa vida privada, cresce, discreta,
mas continuamente. O Estado moderno é menos abertamente dominador, e mais manipulador;
preocupa-se menos em reprimir a desobediência do que em preveni-la. É feito
menos para punir do que para disciplinar. Isto, por sinal, foi admiravelmente
percebido por Hegel – que descreveu na Filosofia do Direito os mecanismos de
integração do indivíduo no Estado e cunhou a fórmula: Der Staat ist eine List
(O Estado é uma astúcia).
Em suma, o poder não é um ser, “alguma coisa que se adquire, se toma
ou se divide, algo que se deixa escapar”. É o nome atribuído a um conjunto de
relações que formigam por toda à parte na espessura do corpo social (poder
pedagógico, pátrio poder, poder do policial, poder do contramestre, poder do
psicanalista, poder do padre, etc., etc.). Por que, nestas condições, conferir tanta honra ao
tradicional e arcaico poder de Estado, constituído na época das monarquias
absolutas europeias?
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