A força política da fé.
*TESE:* a pobreza material aumenta a riqueza espiritual. Enquanto o Mercado tira de um lado e a Igreja ganha do outro, a Política media o jogo da fé. A transição religiosa começa pela periferia, onde poder público e outras religiões não se fizeram presentes no mesmo ritmo da concentração populacional. Ou seja, as igrejas evangélicas vêm assumindo o papel do Estado e da Família, com tração especial entre a população pobre e negra, alijada dos espaços hegemônicos.
Os evangélicos ampliaram a presença na sociedade (hoje eles têm 178.511 igrejas com CNPJs cadastrados). E o aumento não foi só de templos e fiéis, mas também de parlamentares na bancada da fé no Congresso (ao todo, já elegeram 332 parlamentares). Dois partidos de centro-direita, Republicanos e PL, foram a principal guarida deles.
De todos os templos abertos na última década, 80% deles são evangélicos (só de 2013 a 2022 foram abertos 71.745 novos templos evangélicos do total de 89,2 mil igrejas abertas no país inteiro). Estamos falando de *21 igrejas evangélicas abertas por dia (é quase 1 por hora)!* Nesse ritmo, é esperado que esse grupo ultrapasse os católicos nos próximos dez anos (os evangélicos serão maioria no ano de 2032!).
Como explicar esse “Boom Protestante”? Ora, além dos processos de formação de pastores, da forte abertura de igrejas, da pluralidade e descentralização do movimento protestante e da interpretação do texto bíblico atrelado à carência do fiel, ele também está atrelado à comunicação de massa, como a forte presença do gênero religioso na TV, no rádio e nas redes sociais além da forte emoção da música gospel. Porém, *a investida mais certeira foi nos vácuos de assistência espiritual e material* (as chagas abertas pelo crime organizado, a pobreza e o esvaziamento econômico foram consoladas pelo atendimento de igrejas evangélicas em cultos e ações sociais, que incluíam alfabetização e distribuição de cestas básicas). Nesses locais, poder público e Igreja Católica não conseguiram se fazer representar com a intensidade dos evangélicos. Enfim, tudo isso alimenta a potência eleitoral dessa gente e fortes impactos na política (só a Assembleia de Deus, com 43.578 templos, elegeu sozinha 110 deputados e senadores de 2002 para cá).
Não subestimem! Os evangélicos eram 6,6% da população em 1980, e hoje são uns 30%. *Essa galerona vem “garantindo o seu” no Legislativo.* Desde a imunidade tributária de templos, o perdão de dívidas de igrejas, e demandas como a isenções em remessas para o exterior e até a imunidade sobre todos os imóveis e serviços com vínculo religioso. Houve até uma série de passaportes diplomáticos concedidos a líderes religiosos.
Enfim, se dos pobres é o Reino de Deus a quem pertence o
Congresso, o Senado e o Judiciário? A política pertence à fé ou a fé pertence à
política? A Igreja é um lugar bem politizado assim como o Parlamento deva ser
um lugar sagrado? Qual o limite da atuação política e da atuação da igreja? *Estado
Laico, cadê você? Balela!*
· A “Assembleia de Deus” é a maior
rede de igrejas evangélicas do país. Presente em todos os estados da Federação e com 43,5 mil registros em
vigor na Receita Federal, tem mais templos no país do que a quantidade de
agências dos Correios (11 mil) ou lotéricas (13 mil). A cada 4 igrejas
evangélicas abertas na última década, 1 carrega “Assembleia de Deus” no nome.
Estima-se que 25% dos eleitores brasileiros sejam evangélicos – e essa relevância merece atenção! Eles não são um bloco monolítico, mas um grupo plural. Porém, suas diferenças teológicas parecem sumir diante de pautas comuns, como o perdão às dívidas de igrejas e a conquista da bancada evangélica no Congresso – que não deixa de ser um tipo de demanda de interesse pecuniário. Ora, não há problema se candidatos defendam valores de sua religião ou se pastores prestam apoio a candidaturas fora de suas atribuições sacerdotais. O problema começa quando se usa o púlpito para pedir votos ou quando se quer influir em políticas públicas em favor de medidas que ameaçam o caráter laico do Estado. Nesse quesito estão as guerras culturais – ideologia sobre modelo de família e sexualidade.
Como reagirão os pastores hoje colados em Bolsonaro com a vitória de Lula na eleição? Continuarão fiéis à pauta bolsonarista de costumes, ainda que isso represente um lugar na oposição? Ou serão parte da base governista em troca do apoio a decisões que os beneficiem?
Enfim,
a aproximação entre os religiosos e a política merece atenção permanente. Afinal,
ficou impossível analisar a política brasileira sem levar em conta os
evangélicos e católicos.
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