Abraçando a descontinuidade.
Expandir o repertório em vez de forçar uma escolha. Vamos falar das coisas que precisamos abrir mão para ter a vida que queremos?
“O herói trágico não desiste, ele não aprende a desistir, apesar dos males causados a ele e aos outros. Por quê? Qual é o motivo de não desistirmos? A razão é extrema e justa?”.
Podemos ser mais felizes abraçando a descontinuidade com menos peso. Toda essa valorização da persistência é questionável, pois há formas saudáveis de desistir.
Tendemos a pensar em desistir, na forma mais simples, como falta de coragem, como uma orientação vergonhosa ou imprópria em direção ao que é assustador e desonroso. Isso significa dizer que tendemos a valorizar e até idealizar a ideia de terminar coisas em vez de abandoná-las. Por quê?
Há muito trabalho cultural que entra na valorização da persistência, nessa ideia de não desistir. As pessoas que não desistem são vistas como o melhor tipo de gente. É claro que é uma boa ideia persistir na cura para o câncer, ou na luta contra o bullying. Desistir também pode desembocar em fascismo quando, por exemplo, minorias são excluídas da política.
A desistência recebeu uma áurea sombria quando foi associada à maior desistência de todas – o suicídio. Toda descontinuidade pareceu um desafio ao imperativo de que a vida é sagrada. Vivemos em sociedades em que temos que valorizar que a vida vale a pensa ser vivida. Poucas pessoas querem se matar, mas para elas a vida é insuportável (são vistos como delatores). Essa associação radical da desistência-suicídio anulou exceções de muitos casos em que a desistência pode ser a chave para sentir-se mais vivo.
Mas, existem outros contextos e situações. Vejamos:
· A ideia de não
desistir pode causar mais mal do que bem;
· A desistência
pode ser uma pista para nossa complexidade moral e não apenas um de nossos
infortúnios favoritos;
· Nunca desistir
pode significar se torturar;
· Veja só, adictos
nunca desistem. Adictos são pessoas apegadas ou afeiçoadas; dedicadas,
devotas, tais como aqueles que têm compulsão pelo uso de drogas ou por
substâncias psicoativas; dependentes: Os adictos da maconha. E aí? Nunca
desistir? É algo que depende muito do contexto;
· O herói trágico
não desiste, ele não aprende a desistir, apesar dos males causados a ele e aos
outros. Por quê? É possível evitar uma tragédia pela desistência saudável. Do
contrário, a ideia de nunca desistir pode ser fascista!
· É difícil pensar
em desistir. Somos empurrados a aguentar sofrimento, mas esse caminho e o da
desistência precisam estar ambos na mesa;
· Desistir (de
forma temporária ou perene) de alcançar um sonho ou objetivo diante de
dificuldades que encontramos pode ser uma atitude necessária e inteligente.
Porém, quando persistir? Qual o momento certo para deixar um sonho, projeto,
desejo ou ambição de lado?
· A desistência saudável
é um contraponto à ideia popular de que a persistência é a chave principal ou
única para alcançar objetivos. Há uma hora certa de desistir de encontrar um
amor, de deixar de lado o sonho de se tornar um grande jogador de um esporte ou
até mesmo de parar de tratar uma doença, por exemplo;
· Assim, em muitos casos, a desistência pode ser a chave para sentir-se mais vivo.
Para aprender a
desistir, porque o ato requer inteligência, é preciso separar a atenção em dois
tipos:
1.
foco
estreito, que seleciona o que serve aos interesses imediatos e ignora o resto;
2.
foco
amplo, quando não existe um alvo imediato e é possível mirar o todo.
A separação dessas duas atenções visa a expandir o repertório em vez de forçar uma escolha, algo que, consequentemente, força também uma desistência.
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