Periferia... São
pessoas com orgulho atrelado ao consumo. É formada pelas classes C, D e E –
classe média e baixa. Universo de 155 milhões de pessoas (parcela que
representa a maioria da população brasileira). Um contingente de pessoas que
vem se consolidando como um gigantesco exército de consumidores. No ano passado
(2013), eles gastaram, com produtos e serviços em geral, 1,27 trilhão de reais.
Conforme levantamento do instituto Data Popular, só os jovens de classe C
consumiram em 2013 algo em torno de 129 bilhões de reais, contra 80 bilhões das
classes A e B e 19,9 bilhões da D. Como se calcula, tem um poder de compra que
a poria no G20 do consumo mundial, ocupando a 16ª posição no ranking das nações
que mais gastam (o Brasil está hoje na sétima posição). Estaria, dessa maneira,
à frente, por exemplo, de Suíça e Holanda. E compram tanto porque, pela
primeira vez, essas famílias conseguiram romper com a história de pobreza de
seus antepassados. Nesse sentindo, estão deixando a miséria para trás e se
inserindo na sociedade por meio do consumo: estão conseguindo gastar com
supérfluos, como viajar de avião, ter um smartphone, etc. Ainda conforme o
levantamento, a referência às viagens aéreas e aos telefones móveis conectados
à internet ganha peso quando se analisam alguns dados recentes: 54% dos que
tomaram um avião em 2013 pertenciam às classes C, D e E, que, por sua vez, têm
em mãos 58% dos smartphones habilitados.
Durante
décadas, houve pouca mobilidade social no Brasil. Pobre era pobre e classe
média era classe média. Nos últimos anos, a ascensão social foi rapidíssima.
Compreensível: entre 2002 e 2012, a renda familiar média dos 25% mais pobres
cresceu 45%! (a dos 25% mais ricos subiu 13%). E os ricos, invejando ou
debochando, tiveram que engolir o orgulho ferido de vê os pobres também tendo o
direito de consumir. É aquele deboche feito no programa “Zorra Total” e em
personagens de reviravolta nas novelas da Globo. O que aproxima os moradores
das periferias brasileiras é a aspiração de ascender socialmente e ter acesso a
bons serviços e a uma vida confortável. Desse desejo decorrem outras
aproximações. A autoestima elevada e o orgulho mencionados antes (autoestima...
Autoestima... Em cima, em cima!) estão por trás de um sentimento que se espalha
e une diversas periferias: o apego às origens. Na verdade, o sonho de consumo
do morador de bairros pobres se divide em três: ou morar onde vivem os
integrantes das classes A e B (mudar para um local melhor) ou frequentar os
lugares que eles frequentam (shopping centers, por exemplo) ou o orgulho de
viver no subúrbio (agora com o crescimento econômico), mesmo que enriqueçam,
não querem mais sair das periferias por uma questão de identidade cultural.
Muito dessa
atitude de apego às origens está ancorado no empreendedorismo que, cada vez
mais, se faz notar entre os integrantes das classes menos abastadas. De um
total de 11,7 milhões de brasileiros que moram nas periferias, cerca de 20% se
sustentam com a exploração de um pequeno negócio próprio. 47% dos
empreendedores iniciaram a atual atividade há menos de 03 anos! Ou seja, tem o
incentivo do governo aí. Os programas sociais e a distribuição de renda,
acompanhados por maior escolaridade e oportunidades de educação, estão fazendo,
aos poucos, as pessoas a saberem pescar. Estão se tornando empreendedores
autônomos. Então podemos dizer que são duas coisas conjugadas: apoio do governo
e esforços da população. Pois se lembrarmos das políticas sociais que tiraram
30 milhões de pessoas da pobreza entre 2003 e 2009 e do aumento real de quase
70% do salário mínimo entre 2003 e 2012. A maioria dos brasileiros situados nas
classes mais baixas (87%) atribui a seus próprios esforços a melhora de sua
vida, de acordo com o Data Popular. Melhora possível graças à mão governamental
(Lula e Dilma) + trabalho + família + fé...
Os baixos
valores de ganhos nunca deixaram de ser o fruto de uma má distribuição da
renda. Apenas 5% dos brasileiros ganham um salário maior do que 4000 reais por
mês e só 1% ganha acima de 11000 reais. Logo, seria equivocado identificar
apenas 5% da população como classe média. No mundo, não é diferente. 54% da
população mundial ganha menos do que a classe média brasileira.
Mas uma das
conclusões mais importantes que se pode tirar daqui é o fato de que com isso
tudo não se está querendo dizer que, diante de indicadores tão expressivos, a
vida das classes menos favorecidas tenha alcançado padrões escandinavos. Em
2012, 3,2 milhões de domicílios das classes C, D e E não tinham água encanada;
9,2 milhões seguiam sem coleta de lixo e 19,4 milhões sem coleta de esgoto.
Vive-se na periferia o paradoxo de ter um celular de última geração e ser
obrigado a carregar uma lata d’água na cabeça. É a tal da diversidade (e também
das diferenças) regionais. A periferia, com “P” maiúsculo, comporta distintas
periferias, com “p” minúsculo. Na avaliação dos serviços públicos, numa nota de
zero a 10, as classes C, D e E dão nota 4 para a segurança e a saúde; 4,5 para
o transporte e 5 para a educação. E não imaginem total despreocupação política,
mesmo a dos rolezinhos, pois ela reflete o pensamento das classes de menor
poder aquisitivo: embora 54% de seus integrantes avaliem que o Brasil seria
melhor sem partidos políticos, 81% consideram a política um assunto importante e
67% confiam que o voto pode mudar o país.
Ou seja, o
debate não será mais tão focado no legado de cada partido, mas sim no que eles
podem oferecer para o futuro. O jovem dessa classe emergente não está
interessado no que Lula ou FHC fizeram; quer um político que melhore as
condições de vida dele.
Nenhum comentário:
Postar um comentário