Esse fenômeno social acredita que as diferenças não fortalecem o convívio social, mas antes o corrompe, gerando a desordem.
Como definir o bolsonarismo pós-Bolsonaro? Que outro nome será adotado agora que Bolsonaro está impedido de concorrer? Direita “civilizada”? E o vasto capital eleitoral bolsonarista? Quem vai herdar? O que será do bolsonarismo sem Bolsonaro?
As muitas perguntas não sugerem qualquer vestígio de preocupação com esse lado selvagem da sociedade. Apenas são realistas a algo que continuará entre nós. O bolsonarismo se tornou um campo político sem órbita. Carente de um novo nome, um novo candidato para 2026, sua morte não está decretada.
Se o ‘bolsonarismo’ dependesse apenas de Bolsonaro, já estaria morto. Embora a pessoa escolhida para liderá-lo tenha levado uma facada democrática, sobreviverá porque é mais do que um conceito linguístico ou expressão eleitoral. Ele é um vigoroso movimento da sociedade que foi formado antes de Bolsonaro e persistirá após ele. É um fenômeno social, e não meramente eleitoral.
Que
fenômeno social foi/é esse?
A junção das mobilizações anti-PT, o conservadorismo religioso, a hipocrisia do movimento anticorrupção, o formato editorial de setores conservadores da imprensa brasileira, a cultura juvenil da zoeira e o politicamente incorreto turbinado nas mídias sociais. Tudo isso e mais um pouco montou um fenômeno social, e não meramente eleitoral, uma categoria da ciência política que descreve movimentos com discursos antielites propondo conexão direta com o líder carismático e rejeitando instituições de representação como os partidos. Vamos destrinchar...
As violentas mobilizações anti-Dilma de 2015 e 2016, sem nenhum pudor aos palavrões e aos ataques à presidenta, aglutinava e fazia nascer a candidatura de Bolsonaro em 2018. Isto é, o bolsonarismo foi gestado bem antes e assumiu materialidade depois na chapa do verme. Seu combustível foi a mobilização das igrejas católica e evangélicas em 2014 e 2015 contra o uso do termo “gênero” nos planos de educação (nacional, depois estaduais e municipais) e para toda a campanha contra a “ideologia de gênero” que se estruturou desde então, cujas principais lideranças apoiaram Bolsonaro em 2018. Ou seja, o selvagem e o fanático se fundiram e germinaram a fera.
Podemos olhar também para a formação do movimento anticorrupção, que depois se confunde com o movimento anti-Dilma/anti-PT, e para a onda social de apoio à Operação Lava-jato que começa em 2014. Por fim, olhar para a grande mudança editorial de setores da imprensa brasileira, que abraçaram e deram destaque a ideias conservadoras nos anos 2010, ou para a cultura juvenil da zoeira e do politicamente incorreto, que ganhou projeção nas mídias sociais no mesmo período.
Isso quer dizer que a candidatura de Jair Messias Bolsonaro em 2018 é onde deságuam esses e outros movimentos da sociedade brasileira, em seu nível mais natural, bárbaro, brutal e grotesco. Bolsonaro não os criou nem os liderou, apenas os articulou numa candidatura eleitoral. Agora que estão bem amarrados todos esses movimentos sociais conservadores da sociedade, que outro nome daremos a ele? “Populismo”? Continua o “Bolsonarismo”? Uma categoria “nativa”? “Patriota”? “Conservadorismo”? Seja qual for a expressão, ela não será coerente se denotar algo positivo, elogioso ao patriotismo, civismo, progressismo ou nacionalismo real. Um equívoco, pois, embora os bolsonaristas acreditem estar defendendo o Brasil, certamente não são nacionalistas e não defendem a cultura, os empregos ou a economia nacional coisa alguma!
Enfim, estamos lidando com
um movimento de natureza muito complexa, que teve como expressão eleitoral a
candidatura de Bolsonaro em 2018 e 2022 e que deverá ter outro candidato em
2026. Que seja a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro (PL Mulher), ou o governador Tarcísio
de Freitas (SP, Republicanos), ou o Romeu Zema (MG, Novo), ou até mesmo um dos filhos do ex-presidente.
Alguém virá porque as matizes políticas continuarão, alimentadas por fenômenos
sociais que, tais como os opostos, ora se repelem, ora se atraem. Direita e Esquerda, duas faces de uma mesma moeda, com centro e extremos. Assim, nosso maior desafio será controlar e superar esse "inominável" que existe em cada um de nós. Democracia, sempre vigilante!
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